Patricia Carneiro

A Ilusão do Autoconhecimento

Por Patricia Carneiro em Dezembrode 2023

Tema Desenvolvimento Pessoal / Publicado na revista Nº 35

Fomos observando ao longo de 2023 um crescente entusiasmo pelos mistérios energéticos, e uma maior procura pelo lado místico da Vida, pela espiritualidade e pelo autoconhecimento. 

Mas qual será o caminho para o autoconhecimento? Será que existe autoconhecimento sem espiritualidade? E será que espiritualidade está restringida à religião e ao misticismo? 

São estes os temas que trago neste artigo, como proposta de reflexão. 

AUTOCONHECIMENTO 

Vamos começar pelo entendimento geral do que é o autoconhecimento.

O autoconhecimento pode ser visto como a consciência que a pessoa tem de si diante das experiências e situações que a vida lhe apresenta. É a capacidade da pessoa de se observar, de refletir sobre as suas escolhas e motivações, identificar padrões de pensamento e hábitos pessoais que podem ser aperfeiçoados, perceber quais os seus medos, as suas limitações, as suas virtudes, os seus talentos, e identificar as suas crenças limitantes. No fundo, é a capacidade da pessoa de se investigar a si mesma.

Esta habilidade da pessoa de se conhecer a si mesma é das mais importantes para o seu desenvolvimento e crescimento, tanto pessoal como profissional, porque possibilita desenvolver autoconfiança, construir uma boa autoimagem, melhorar a sua autoestima, tomar decisões mais assertivas, obter mais clareza para definir as suas metas, e com isso adquirir um maior controlo mental e emocional.

A CHAVE PARA A SÁUDE MENTAL

O autoconhecimento por desenvolver todos estes aspetos, tornou-se a chave para a saúde mental. 

E por isso, desde 2020 temos vindo a observar um crescente interesse por este processo de autorreflexão e de introspeção, uma vez que a pandemia desencadeou e acelerou estados de ansiedade, depressão, e outros problemas de saúde mental. Então o autoconhecimento passou a ser percebido como um dos fatores mais importantes para o nosso bem-estar e saúde mental.

O AUTOCONHECIMENTO E O BEM-ESTAR DA MENTE HUMANA

Mas conhecermo-nos a nós mesmos não é uma tarefa fácil. Entender o que se passa no nosso mundo interior é um desafio permanente, que requer coragem e disciplina. Coragem, porque este processo traz à superfície partes do nosso mundo interno que nós colocamos de lado e que não nos sentimos confortáveis para lidar com elas. Disciplina, porque este processo precisa de ser praticado diariamente, de maneira a que seja possível desviarmos a nossa atenção do que está a acontecer ao nosso redor e focarmo-nos em nós mesmos.  Algo extremamente desafiante nos dias de hoje, com o excesso de estímulos externos a que estamos submetidos constantemente. 

UM OLHAR NO ESPELHO

Porém, só quando paramos para nos “vermos” é que conseguimos obter uma maior perceção das nossas dinâmicas físicas, mentais e sociais.  Ganhar consciência sobre estes aspetos é o primeiro passo para conseguirmos evoluir e crescer. Pois não podemos mudar e aperfeiçoar aquilo que não conhecemos. Então o processo do autoconhecimento é como se estivéssemos a olhar ao espelho. Através do reflexo do que vemos, podemos fazer a nossa análise e estabelecer propostas de melhoria e de correção.

Aqui reside a ilusão “deste” autoconhecimento tradicional. Este conhecimento de nós mesmos está limitado àquilo que conseguimos ver, através das nossas lentes e filtro mental, tornando-se por isso um processo de autoconhecimento superficial.

AO ENCONTRO DA ESPIRITUALIDADE

Esta proposta de autoconhecimento está reduzida à identificação daquilo que a mente acha que a pessoa é. Mas como o próprio nome indica, a mente … mente. 

É por isso que vemos frequentemente, pessoas que se consideram conhecedoras de si mesmo a nível mental, a desenvolverem estados de vazio interno. Estão identificados com aquilo que não são, com os seus pensamentos, com os seus bens materiais, com as suas crenças, com o seu corpo, com o seu Ego. Mas fica sempre aquela sensação de que falta algo. E o que falta? A sua essência, a sua espiritualidade. 

O AUTOCONHECIMENTO DA NOSSA ESSÊNCIA

Quando me refiro a espiritualidade, não estou a falar de religião e religiosidade. Apesar do conceito aqui apresentado não excluir estas duas, a elas não se restringe. 

Espiritualidade tem a ver com essência. Conhecimento de si mesmo, como ser espiritual que somos. E para considerar esta dimensão espiritual dentro do autoconhecimento é preciso abrir janelas de compreensão para a multidimensionalidade do ser. 

O autoconhecimento tradicional ao centrar-se apenas no processo do individuo sobre o conhecimento de si enquanto “corpo físico”, fortalece o Ego e a construção da personalidade do individuo, mas não leva a pessoa para além desta realidade tridimensional, ficando muito aquém do seu potencial de crescimento e evolução. Limita a consciência de si mesmo a uma realidade material. 

Por isso, se a pessoa apenas se focar no conhecimento de si mesmo através da lente dos seus olhos e do que se passa na matéria, ficará sempre limitada ao lado visível da vida, e não irá conseguir ver o essencial: a sua essência. E já dizia o pequeno príncipe, “o essencial é invisível aos olhos”. A pessoa que não abraça esta proposta de evolução, irá sentir-se sempre incompleto, precisando de procurar “fora” o que não consegue conquistar dentro. Sendo manipulado e enganado pela própria mente. Será sempre um passageiro e não o condutor da sua vida.

A MULTIDIMENSIONALIDADE DO SER

Mas numa proposta de autoconhecimento, que nos leva além da matéria, além do corpo físico, além desta ilusão mental da realidade, encontramos um caminho de conexão ao Universo. Um caminho de aproximação a quem realmente somos. Tornamo-nos inteiros. Começamos a viver uma experiência de vida na sua plenitude. Deixa de existir o vazio existencial. A vida passa a ter um sentido e um propósito. 

Para isso, é preciso investir num autoconhecimento que leva em consideração a tríade da saúde e do equilíbrio da vida humana: a mente, o corpo e o espírito. Estes 3 pilares são cruciais para encontrar bem-estar, paz interior, cultivar valores espirituais elevados, aprimorar a nossa ética, melhorar e qualificar a nossa energia consciencial, e conquistar saúde emocional, mental e física. 

A EXPERIÊNCIA HUMANA

No entanto, para chegar então a este processo de evolução de consciência, é preciso o entendimento de que somos um espírito, uma energia inteligente a viver uma experiência humana. O corpo é apenas o veículo de manifestação do espírito na matéria, um instrumento que a consciência utiliza para a sua evolução. Ele ajuda a consciência a progredir através das suas experiências e interações no plano físico. Mas esta é só uma parte de nós, da nossa realidade. Também existimos em outras dimensões. A consciência utiliza outros veículos de manifestação, como o corpo energético, o corpo emocional e o corpo mental para atuar noutros planos dimensionais. 

AUTOCONHECIMENTO NO PARADIGMA CONSCIENCIAL

Entramos assim no paradigma consciencial. Se a consciência se manifesta através destes veículos, mas não é nenhum deles, significa que a consciência não deixa de existir após a morte biológica. Neste universo multidimensional, a consciência evolui ao longo de uma série de existências, em diferentes corpos físicos, uma vez que a energia não pode ser destruída, apenas transformada. Então a consciência vive uma série de vidas sucessivas, mas com uma “aparência” diferente.

O corpo é apenas o veículo, é a ferramenta que possibilita a manifestação da consciência, que somos nós. O corpo é a máquina e nós somos o operador da máquina.

AUTOCONHECIMENTO MULTIDIMENSIONAL

Agora, se o autoconhecimento tradicional fortalece a pessoa perante a vida e ajuda a obter um maior controlo (aparente) sobre si, imaginem o potencial de crescimento e evolução que se pode obter através de um autoconhecimento multidimensional, que ensina a pessoa a reconhecer-se a si mesma, para além daquilo que ela manifesta (o EGO)?!

PROPOSTA DE REFLEXÃO

E como podemos obter conhecimento sobre nós enquanto consciência, enquanto energia, enquanto espírito? Nos dias de hoje, já existem vários métodos e técnicas terapêuticas que nos ajudam a conhecer melhor estas dinâmicas multidimensionais, mas vou deixar em aberto esta questão como proposta de reflexão e que terei todo o gosto em esclarecer num posterior artigo de seguimento.

O DESPERTAR DA CONSCIÊNCIA

Aqui pretendia apenas clarificar que atualmente o modelo que prevalece do autoconhecimento é materialista, reconhecendo a existência apenas do mundo físico, com os constituintes da realidade regidos pelas leis da física clássica. Mas torna-se limitado por ignorar a realidade mais ampla da consciência que transcende a matéria. 

Vimos, que segundo este pressuposto, para existir um verdadeiro autoconhecimento é necessário entrar em contato com a nossa espiritualidade. Mas que este contato com a espiritualidade, como expliquei anteriormente, não é a religião nem misticismo exagerado. Espiritualidade vem de essência. E desta forma, a cura e evolução do ser humano é o conhecimento de si mesmo, como ser multidimensional. Só assim conseguimos ampliar a visão, sair da ilusão desta realidade material e tornarmo-nos seres humanos cada vez melhores e íntegros. 

A EVOLUÇÃO

Então a evolução consiste nesta alteração da visão, de aprendermos a ver. 

Melhorarmo-nos a nós próprios não é mais do que aprendermo-nos a ver e a reconhecer tal como somos, e não apenas aquilo que achamos que somos (o Ego). Isto, a maior parte das pessoas, nos dias de hoje, já o fazem. E temos vindo a perceber pelo que se passa no mundo que não é suficiente. É preciso ir além desta ilusão do autoconhecimento tradicional.

Estamos a precisar de passar por um processo de reeducação, para que possamos encontrar uma nova forma de sentir e de pensar a vida. A solução para a paz interior passa por esta transformação de visão, pelo processo do Despertar Espiritual. Pela necessidade da pessoa parar para refletir sobre o seu papel no mundo, sobre as suas ações e valores internos, de compreender o que veio aqui fazer e para onde vai. De entender que estamos todos interligados. Deixar o foco do EU e passar para o NÓS. O mundo precisa de mais pessoas a contribuir para este despertar da consciência. 

Portanto, chegamos novamente à conclusão que todos os problemas se reduzem à velha máxima: conhece-te a ti mesmo!

Espero ter contribuído para uma melhor compreensão do processo do autoconhecimento e da sua ligação com a espiritualidade, e de ter ajudado a abrir novos caminhos e novas formas de pensamento.

PATRÍCIA CARNEIRO

Terapeuta Integrativa


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