O Mistério Divino : Do Absoluto ao Cristo Cósmico (Parte I )
Por Daniel Faria em Maio de 2023
O Absoluto: da Transcendência à Imanência
A sabedoria esotérica perene que constitui o fundamento das diversas tradições religiosas, filosóficas e espirituais da humanidade reconhece o princípio de que por detrás por detrás de tudo que o que é visível ou invisível, existe uma Realidade absoluta, eterna, ilimitada e imutável.
Esta Realidade é o Princípio eterno, omnipresente, infinito, imutável, inconcebível e inefável. É o supremo e eternamente não manifestado, que antecede todo o manifestado. É a Raiz sem raiz de tudo o que foi, é e será.
Tal Realidade não foi causada por nada, mas é a causa de tudo o que existe. Não tem origem em nada, mas tem as coisas têm na referida Realidade a sua origem.
A Essência Absoluta ora é ativa ou passiva, em sucessões alternadas, regulares e harmónicas.
Esta Realidade – que permanece além da existência limitada, relativa ou objetiva, pode-se chamar Absoluto não manifesto ou imannifesto.
Toda a história da existência e evolução do universo desenvolve-se em ciclos ou períodos de tempo. Existem períodos de atividade e inatividade, chamados de Manvantaras e Pralayas, ou "Dias e Noites de Brahman".
De uma forma periódica e cíclica, inicia-se o Dia de Manifestação Cósmica. Do Absoluto, imanifestado, transcendente e ilimitado, Fonte de tudo o que existe, projeta-se um plano de manifestação cósmica, sendo a origem, a causa e o fundamento do ser e da vida dos universos e das infinidades de seres que aí vivem.
Ao projetar-se no plano de manifestação, o Absoluto é o Uno mencionado nas grandes religiões e filosofias.
O monoteísmo não existe somente nas religiões abraâmicas, designadamente o judaísmo, o cristianismo, o islão e a fé bahá'í.
Com efeito, as grandes tradições espirituais do Oriente e do Ocidente, sobretudo na sua dimensão esotérica e mística, têm reconhecido que, por detrás da pluralidade de poderes criadores hierarquizados, está o Uno, a Fonte Inefável de tudo o que existe.
Da Unidade à Trindade
Se as grandes tradições religiosas e filosóficas reconhecem que a Essência Divina é una, também preconizam que o Uno se manifesta numa Trindade.
Quando se desenvolve o plano de manifestação, o Absoluto desenvolve-se em duas polaridades: a polaridade ativa e masculina, reflexo de Parabrahman; e a polaridade recetiva e feminina, reflexo de Mulaprakriti.
Quando o Absoluto se manifesta para gerar o universo, ele se torna o Parabrahman ou Pai, manifestando a Vibração Cósmica.
A força vibratória que emana do Absoluto é a Vibração Cósmica. Nas escrituras hindus, a Vibração Cósmica é designada Om ou Maha-Prakriti, a Grande Natureza ou a Mãe Cósmica que dá a luz branca a toda a criação. A tradição esotérica judaico-cristã reconhece o aspeto feminino do Divino, a Ruach HaKodesh, também denominado como o Espírito Santo ou a Mãe Divina. Na teosofia, a polaridade feminina da Essência Divina é designada como Mulaprakriti. O Som Cósmico sagrado do Om ou do Amén é a testemunha por excelência da Presença Divina manifestada na criação no seu todo.
Da interação do Amor eterno entre as duas polaridades do Absoluto – Parabrahman e Mulaprakriti, Parusha e Prakriti, Espírito e Matéria, Pai Divino e Mãe Divina – surge uma terceira polaridade, de que falaremos a seguir.
A vibração cósmica em todo o espaço não pode por si só gerar ou sustentar um cosmos infinitamente complexo. A manifestação da vibração cósmica em formas que desenvolvem progressivamente em todo o universo implica a presença de uma inteligência infinita.
Fazendo uma breve ponte entre a espiritualidade e a ciência, constata-se que os avanços mais recentes da ciência contemporânea e da física em particular têm promovido um conhecimento mais profundo da natureza vibratória do universo. Com efeito, a teoria das cordas declara que os menores elementos constituintes da matéria são as cordas. A forma como as cordas oscilam é aquilo que forma o substrato de todas as partículas e forças que existem no universo. Num nível ultramicrocóspico, o universo pode ser comparado com uma sinfonia de cordas vibrando a matéria em manifestação.
A consciência transcendente de Deus Pai manifestou-se na vibração do Espírito Santo ou da Mãe Divina como o Filho, a Consciência Crística, a inteligência divina presente em toda a criação.
Esta Trindade fundamental – Pai Divino, Filho Divino, Mãe Divina – é reconhecida em diversas correntes religiosas e filosóficas sob diversas denominações.
No hinduísmo, fala-se em Shiva, Vishnu e Brahma. Na antiga religião egípcia, temos Osíris, Ísis e Hórus. No cristianismo exotérico, refere-se a Pai, Filho e Espírito Santo.
Falou-se no cristianismo exotérico, porque existe uma linhagem esotérica e gnóstica no cristianismo, que foi menosprezada e inclusive perseguida pelos poderes instituídos ligados ao cristianismo institucional.
O cristianismo gnóstico tem uma influência relevante da Cabala judaica, que reconhece como emanações da Divindade Una Kether, Chokmah e Binah.
De acordo com o cristianismo esotérico, o aspeto masculino do Divino é a Profundidade, também chamado de Inefável e Primeiro Pai.
O aspeto feminino do Divino é a Barbelo, a Mente Cósmica, a Sabedoria Divina Suprema, a Mãe Divina e a Pronoia, termo que se pode traduzir como Pensamento Primordial. Corresponde à Ruach HaKodesh do judaísmo místico e ao Espírito Santo do cristianismo exotérico. Nas línguas semíticas, o termo Ruach, com o qual se identifica o Espírito Divino, é do género feminino. Existem textos do cristianismo siríaco, que tem influências gnósticas, que referem expressamente ao Espírito Santo como consoladora.
Segundo o gnosticismo, do amor eterno entre o Espírito Invisível, o Uno, o Pai Divino, e a Barbelo, a Mãe Divina, gera-se o Filho ou o Cristo Cósmico. O Cristo faz a ponte entre a Trindade Divina e os demais seres que compõem o Pleroma e consequentemente a Criação no seu todo.
Fazendo uma análise comparativa entre o cristianismo gnóstico e a teosofia, pode afirmar-se que o Cristo Cósmico é o Fohat.
Com efeito, o Fohat é uma força fundamental na génese e na evolução do Cosmos. Ele é coeterno com Parabrahman e Mulaprakriti. Ele é a força aglutinadora de ambos. Fohat é o primeiro elo entre o Incondicionado e o manifestado, sendo é o próprio impulsionador da Manifestação Divina.
Daniel José Ribeiro de Faria
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